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Eis que o pregador saiu a semear... A necessidade de “ser visto pelos homens” na sociedade do espetáculo

Por Isabella Barbosa

Um certo pregador reuniu algumas ovelhas para evangelizar. Em um bairro qualquer, foram de casa em casa, entregaram folhetos, fizeram orações por alguns transeuntes e, num dado momento, ele chamou uns meninos que estavam por perto para tirar uma foto. Sorriu, abraçou-os, aguardou um pouco ali, no meio deles e, após uns clicks, mandou-os sair: “Agora vocês podem ir embora”, sem aquele sorriso da foto. Em instantes, a foto estava nas redes sociais, com a legenda PREGANDO A PALAVRA DO SENHOR AOS MAIS CARENTES.

É possível que essa narrativa seja ficção. Uso-a aqui para tratar de uma realidade cada vez mais comum em nossos dias: pelo post, tudo vale a pena!  Vivemos na “sociedade do espetáculo”, em que se “prefere a imagem à coisa, a cópia ao original, a representação à realidade, a aparência ao ser”[1]. Segundo Guy Debord, “o espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas, mediada por imagens”. Imagens são um tesouro numa sociedade em que “o que aparece é bom, o que é bom aparece”.

Essa lógica engendra a vida diária e, para muitos de nós, as experiências por si só não estão bastando mais. Elas só são completadas e ganham valor se forem publicadas. Assim, não basta fazer aquele passeio, é preciso compartilhar! Não basta comer nesse ou naquele restaurante, é preciso divulgar para que todos vejam que lá estivemos. E que bom se a imagem se alastra, espalha-se como penas lançadas ao vento. Nisto está o valor da experiência: na contemplação,  na representação, na aparência e no reconhecimento alheio de seu valor, corroborado com um ínfimo like. E pelos likes muitos comem, sorriem, passeiam, abraçam... evangelizam.

Para aquele pregador, não bastou ir de porta em porta em um bairro comum, de gente simples, dizendo: Jesus te ama! Não bastou perceber aquelas crianças, sorrir com elas, conversar um pouco. Assim como os fariseus descritos por Jesus, que faziam longas orações nas praças para serem vistos pelos homens, aquele pregador precisava ser visto, precisava ser admirado.

Ah, se aqueles fariseus vivessem hoje em dia, na sociedade do espetáculo! Certamente suas postagens teriam centenas ou milhares de curtidas. Eles, decerto, também fariam de tudo pelos likes. Eles engrossariam a fila dos que não se contentam em viver a experiência com a câmera desligada: a oração por si só não lhes bastaria, a evangelização por si só não satisfaria. Como tantos, eles se vangloriariam, silenciosos, no espetáculo!



[1] Feurbach


Comentários

  1. Infelizmente essa é uma triste realidade: Geração selfie, vazia, oca de sentimentos...

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